Classificação de grutas do Algarve está em consulta pública
Após a apresentação de propostas pela CCDR (Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional, I.P.) do Algarve, estão em consulta pública os procedimentos de classificação das grutas de Ibn Ammar, em Lagoa, e o Algarão do Remexido, em Silves, ambas consideradas de relevância natural e cultural.
A abertura dos dois procedimentos foi efetuada pelo Património Cultural, I.P, em 4 de setembro último, na sequência de proposta dos serviços regionais de cultura da ex-Direção Regional de Cultura do Algarve, atualmente unidade de cultura da CCDR do Algarve, efetuada em 2022.
As grutas de Ibn Ammar situam-se entre Tapadinha e Vale Crevo (Mexilhoeira da Carregação, na União das Freguesias de Estômbar e Parchal). Trata-se de uma série de aberturas dispostas ao longo da margem esquerda do rio Arade, que fazem parte de um complexo sistema de galerias subterrâneas naturais com utilização humana pré-histórica e histórica.
O processo de classificação dessas grutas baseia-se igualmente nos valores histórico, arqueológico, científico, paleontológico e etnográfico associados, bem como aos fatores de antiguidade, memória, autenticidade, singularidade e exemplaridade.
Poeta e político árabe
Também conhecidas como Cavernas da Mexilhoeirinha, elas são as maiores a sul do Tejo. Essa foi a primeira designação de que há registo, em alusão à povoação mais próxima. Mas a partir da década de 1970, a grande maioria dos autores refere-se às cavidades como Grutas de Ibn Ammar, designação que parece emergir da década anterior, aquando das primeiras tentativas de as constituir como atração turística. Abû Bacr Muhammad Ibn Ammâr (1031-1084) foi poeta e político árabe que chegou a governador de Silves.
Por baixo do Algarve que conhecemos, existem dois conjuntos de galerias, a 120 metros de distância um do outro, sem ligação conhecida que permita a progressão humana de um para o outro, com um lago subterrâneo, nascentes e estreitas passagens labirínticas.
Algumas das primeiras pesquisas concretas a que se acedeu no sítio foram realizadas por biólogos. Esta é uma das principais cavidades do sistema subterrâneo do Algarve, que foi classificado em 2016 como hotspot mundial de biodiversidade cavernícola na “Science”, uma das mais importantes revistas científicas.
Esses ecossistemas subterrâneos são extremamente importantes em matéria de saúde pública, nomeadamente no que respeita à água: em Portugal, cerca de 50% da água disponível para consumo humano provém de aquíferos de profundidade.
Essas grutas não são passíveis de visita pública por motivos de segurança e por albergarem uma importante e frágil colónia de morcegos de espécies legalmente protegidas.
Remexido
O Algarão do Remexido, situado na freguesia de São Bartolomeu de Messines, é igualmente uma gruta natural com interesse arqueológico e à qual se associa a memória popular de que terá constituído o local de refúgio prolongado do famoso guerrilheiro miguelista, cuja alcunha era Remexido.
A ocorrência de vestígios junto à entrada da gruta e principalmente a presença atestada de cerâmicas manuais no seu interior, provavelmente da Idade do Bronze, testemunham a utilização pré-histórica da cavidade.
Outro uso mais recente envolveu alteração significativa do espaço na primeira sala, através da remobilização massiva de pedras e grandes blocos. Essa evidente intervenção humana harmoniza-se com a memória popular de que o local serviu de refúgio prolongado do famoso guerrilheiro miguelista José Joaquim de Sousa Reis (o Remexido).
Segundo a recolha documental do historiador José Vilhena Mesquita, o guerrilheiro teria permanecido escondido nas imediações da aldeia, numa fase de prostração e desânimo. Tal situação ter-se-ia agravado quando seus familiares diretos sofreram graves consequências do conflito, apesar da amnistia político-militar então decretada pelo governo.
Seu filho Manuel da Graça Reis foi detido e encarcerado no presídio de Silves, e Maria Clara Machado de Basto, sua esposa, foi submetida a punição pública no adro da Igreja de Messines, com rapagem do cabelo e suplício de palmatoadas.
Essas grutas também não são passíveis de visita pública por motivos de segurança e de proteção da sensível biodiversidade cavernícola. A unidade de cultura da CCDR do Algarve salvaguarda o património cultural, além de estudos, projetos, obras, programação, promoção cultural, incentivo à leitura e acesso à informação. Mais detalhes podem ser consultados em Património Cultural, I. P..