Vitor Hugo Gonçalves, CEO da Sociedade da Água de Monchique: «Somos um produto de alta qualidade»
«A estrutura geológica da serra de Monchique que é tão especial e tão sagrada» permitiu que corra a 900 metros de profundidade «uma água alcalina, natural, rara, inimitável» que dá pelo nome de água de Monchique.
Diferencia-se no aspeto exterior pela sua tampinha cor de rosa ou pela elegância da Chic, mas sobretudo pelos benefícios que pode trazer para o ser humano através do seu pH de 9,5. É através destas caraterísticas e pela sua rigidez que Vitor Hugo Gonçalves, CEO da Sociedade da Água de Monchique, define o seu produto como «um diamante».
Jornal de Monchique – O que é que caracteriza a Sociedade da Água de Monchique?
Vítor Gonçalves – A Sociedade da Água de Monchique foi fundada em 1992 e adquirida por nós em 2010. Durante estes anos o sector das águas e a empresa foram alvo de grandes mudanças tecnológicas. Curiosamente a Monchique foi a primeira empresa do sector, a nível nacional, a engarrafar em PET e tem na sua história e essência um caráter e um espírito inovador e de vanguarda. Todavia, o grande marco da Sociedade da Água de Monchique é mais recente e distingue-se pela valorização das características da água que até então nunca tinham sito exploradas, fazendo com que a água de Monchique seja reconhecida pelos consumidores como um produto diferente, único e raro, em Portugal e no mundo.
JM – O que é que permitiu essa mudança?
VG – Foi através de uma mudança de mentalidade, sobretudo internamente na empresa. Houve obviamente muito investimento em marketing, muito seletivo, alguma astúcia e inteligência na forma como fizemos a aproximação aos mercados e aos agentes certos para passar a mensagem. Temos uma água alcalina, natural, muito específica, muito rara, inimitável, o que nos torna únicos. Atualmente, na perspetiva do consumidor, quer em Portugal quer no mundo, somos um produto de alta qualidade, muito procurado e uma das mais interessantes e equilibradas águas.
JM – Quais são os principais mercados?
VG – Os nossos principais mercados são Portugal, China, Espanha, Hong Kong, mas infelizmente já não temos capacidade de dar resposta a todas as encomendas.
JM – O que é que falta?
VG – Falta produção. Estamos a selecionar clientes. A capacidade de produção é limitada, portanto, teremos de realizar o mais rapidamente possível investimentos para recuperar e para conseguir responder aos clientes, nomeadamente à exportação, que nos dá um valor acrescentado de venda superior ao do mercado nacional.
Por exemplo, em 2014/2015 o volume de exportações foi mais elevado que em 2016 diminuindo 5 a 6 %, isto deveu-se precisamente à falta de produção e ao facto de que privilegiámos os contratos de fornecimento nacionais. Se tivéssemos produção suficiente provavelmente os números das exportações iriam subir vertiginosamente.
JM – Esses investimentos passam por construir uma nova fábrica de engarrafamento?
VG – Estamos em fase de estudos quanto a isso. É uma realidade que vai ter que avançar, obrigatoriamente, seja numa requalificação destas instalações, seja numa nova fábrica, noutro local, sempre aqui em Monchique. É uma situação que temos de resolver, temos de investir em maquinaria, em tecnologia, em infraestruturas e está nos nossos planos, tanto é que temos um projeto do Portugal 2020 aprovado destinado a esse investimento.
JM – Já têm alguma data prevista para o começo dessa reestruturação?
VG – É difícil avançar com datas. Não quero prometer aquilo de que não tenho certezas, mas temos todo o interesse em que o projeto avance o mais rápido possível, porque como não estamos a corresponder à procura, todos os dias perdemos mercado. No entanto, estes projetos de requalificação ou de construção são altamente complexos e demoram o seu tempo, pelo que nunca completaremos o projeto num período de menos de um ano.
JM – Há algum condicionamento em levar o engarrafamento daqui para outro local?
VG – Não. Aliás, é fácil fazer a mudança, mas é dispendiosa. O layout desse transporte tem de ser bem feito, para assegurar todas as questões de qualidade no transporte da água.
JM – Esse aumento de capacidade pode gerar empregos para o concelho?
VG – Nem é necessário esperar pela nova infraestrutura. Estamos a fazer uma reorganização de horários e precisamos de mais pessoas. A minha visão de gestão assenta muito nos trabalhadores, na distribuição de resultados, dando incentivos financeiros e não só. Temos o cuidado de fazer uma gestão cuidada por dois motivos, um porque considero que as empresas são as pessoas e outro pela dificuldade que temos em contratar gente. Este problema já foi comunicado até ao presidente da Câmara Municipal de Monchique, e pelos vistos é algo transversal. Temos empregos para dar, não temos gente suficiente ou gente com perfil indicado para ocupar esses postos de trabalho. Estamos a contratar gente e esperamos que as pessoas do concelho de Monchique tenham iniciativa para vir cá propor-se para os empregos que temos para oferecer.
JM – Quantas pessoas é que empregam?
VG – Estamos com 33 pessoas, e destas cerca de 70% são do concelho de Monchique.
JM – Neste momento, quantos litros de água são engarrafados?
VG – Há dez anos esta empresa engarrafava 5 milhões de litros e há 4 anos engarrafámos 20 milhões de litros, no ano passado fechámos com 62 milhões de litros e este ano fecharemos, provavelmente, com 80 milhões de litros. Tem havido um aumento exponencial da capacidade da produção/vendas, porque não trabalhamos com stocks. Tudo o que produzimos vendemos.
JM – A água que sai da nascente é a mesma que chega à garrafa?
VG – É exatamente a mesma. A legislação europeia é muito restritiva na regulamentação das águas minerais e de nascente, ou seja, as águas que se dizem naturais, como a nossa, nunca poderiam ter essa menção se não o fossem a 100%. Não há qualquer processo de adulteração na água. Ela é engarrafada tal qual vem da natureza e aí reside a nossa força.
JM – Como é feito o processo de captação?
VG – Nós captamos a água a 900 metros de profundidade, artesianamente, através de um sistema de bombagens. Nas duas captações que exploramos ela sai à temperatura de 26/28 graus celsius e depois é passada para a zona de filtragem, obrigatória por lei.
JM – A captação está na sua máxima exploração?
VG – Existe ainda um potencial de aproveitamento, mas também há da nossa parte um cuidado muito grande para não sobre-explorar as captações. Temos mantido um equilíbrio entre o caudal de exploração e o não explorado, o que é muito importante para a renovação dos lençóis e para não esgotar recursos.
JM – Há a possibilidade de esgotar os recursos?
VG – É algo que não prevemos que aconteça. Os caudais que exploramos são conhecidos deste a época dos romanos e têm variado muito pouco.
JM – Qual é a diferença entre a marca Monchique e a Chic?
VG – A nível de embalagem é óbvio. São dois produtos diferentes, para dois segmentos de mercado diferentes, com duas tipologias de distribuição diferentes. Quanto à água é muito similar, diria que é praticamente igual, sendo que a Chic é de origem de um furo mais antigo e a Monchique de um mais moderno.
JM – Fala-se muito no grau de alcalinidade da água de Monchique…
VG – No mundo existem águas alcalinas, mas em 95% dos casos são artificiais, ou seja, são quimicamente ou mecanicamente adulteradas. Nós temos a sorte de termos uma água que é naturalmente alcalina. Este desenho químico natural da nossa água confere uma estrutura físico-química altamente rígida e consistente e isso significa que pode estar 10 anos armazenada que irá manter todas as suas características. Isto já não acontece a outras transformadas artificialmente. A Monchique tem esta particularidade, por isso eu chamo que é o nosso diamante também pela rigidez química que apresenta.
JM – O que confere essas características à água?
VG – É a estrutura geológica da serra de Monchique que é tão especial e, eu diria até, sagrada.
JM – O sabor da água de Monchique é diferente?
VG – Há duas variáveis químicas que influenciam o sabor das águas. Uma tem a ver com o pH e outra com a mineralização. A água de Monchique tem uma mineralização média, e um pH elevado e isso dá uma sensação no palato muito característica, mais adocicada e mais aveludada, diferente das outras águas.
É uma água que é reconhecida imediatamente quanto é bebida, o que é um ponto diferenciador muito positivo e carece de habituação no seu consumo. Para além disso, considero que, se ao a ingerirmos tivermos a noção de que vai trazer grandes benefícios para a nossa saúde, o sabor é quase secundário.
JM – Quais os benefícios que a água de Monchique pode trazer para a saúde?
VG – São inúmeros. Quando enveredamos pela estratégia do pH, o que além de outras coisas é o que diferencia a nossa água, fizemos estudos aprofundados sobre a influência do pH no ser humano e chegamos a conclusões muito interessantes e até algumas surpreendentes. Há um médico alemão, prémio nobel da Medicina em 1931, Dr. Oto Warburg, por exemplo, que afirma que as doenças, inclusivamente o cancro, não proliferam em ambientes alcalinos.
Como tal, o pH é o potencial de hidrogénio que varia numa escala de 0-14, em que zero é altamente ácido, 14 altamente alcalino e 7 é neutro. A nossa alimentação é na sua maioria ácida, nomeadamente as carnes, os refrigerantes e a maior parte dos alimentos processados. Para além disso, há o stress do dia a dia, a poluição e o envelhecimento, que não é mais que a oxidação celular, e um processo de acidificação natural, tanto é que o ser humano nasce alcalino e morre ácido. Pelo que para mantermos saudáveis, devemos manter um corpo tendencialmente alcalino.
A água de Monchique é muito particular, porque como tem um pH de 9,5 que ajuda a fazer essa compensação à má alimentação, ao stress ou à poluição a que somos sujeitos. Ajuda a um reequilíbrio do pH, evitando que o sangue ou o nosso organismo tenha de recorrer a sistemas internos de alcalinização, por exemplo e nomeadamente ao cálcio dos ossos.
Os nossos consumidores dão-nos um feedback muito positivo e é um dos motivos porque privilegiamos o mercado nacional. Recebemos muitos contactos de pessoas com problemas de saúde, nomeadamente refluxos, doenças autoimunes, e outras muito mais graves, em que a água Monchique ajudou e eles reconhecem e agradecem. É isto que nos move e nos motiva.
JM – Que comentário faz ao facto de alguns restaurantes do concelho não apresentarem como primeira escolha a água de Monchique?
VG – Isso é uma luta pessoal. Para mim é incompreensível. Podem alegar fatores económicos e falta de distribuição, contudo há alternativas e, se houver vontade das pessoas, as coisas acontecem. Todos temos uma responsabilidade muito grande sobre a economia local, que pode melhorar nos pequenos gestos do dia a dia, como por exemplo, consumindo produtos que sejam de Monchique. A economia depende de cada um de nós, todos somos agentes económicos e juntos podemos fazer a diferença e não é por mais um ou dois cêntimos na compra do produto que deixa de ser rentável. Antes pelo contrário, o retorno pode ser muito maior e pode criar mais-valias para o concelho. Até porque não faz sentido que uma água que é procurada em todo o mundo e em todo o país de uma forma incessante, tenha ainda tão pouca visibilidade na sua terra, mas há algumas honrosas exceções.
JM – Como descreve a relação que a Sociedade da Água de Monchique tem com a população local?
VG – Desde que eu administro a empresa que tenho o cuidado de abrir a nossa empresa às pessoas. Neste momento temos estruturas limitadas, não podemos ter maior abertura, mas no futuro penso que poderemos abrir mais à população. Tenho intenção de criar um museu da água de Monchique ou de permitir a abertura da fábrica a visitas. Há da minha parte e haverá sempre uma abertura da empresa à comunidade, não fazendo sentido o contrário. Primeiro que o mundo seja global é local, e compete-nos influenciar quem está mais perto. Nós exploramos um recurso que é de Monchique, que é de todos, cabe-nos também devolver isso à comunidade e é isso que temos tentado fazer.
A nossa visão, partilhada por todos os funcionários, é estarmos com as comunidades, devolvendo parte do sucesso que temos. Daí estarmos associados a projetos culturais, solidários, desportivos e às associações locais, como os bombeiros. Temos sempre a porta aberta para virem buscar a água que necessitarem. Não sou de Monchique, mas sinto esta terra como se fosse minha. Aqui sinto-me em casa.
O que é engarrafar em PET ?
São garrafas em polietileno tereftalato que possuem propriedades termoplásticas. Este polímero é utilizado, principalmente, em fibras para tecelagem e embalagens para bebidas.