Sete «Terras»
Em 1610, Galileu Galilei iniciou a astronomia moderna ao utilizar um telescópio, que tinha ele próprio melhorado, para observar a abóbada celeste nocturna. Viu o que ninguém antes tinha podido ver só com os olhos e descobriu, exemplo maior, que o planeta Júpiter tinha quatro luas. Esta descoberta foi muito importante para suportar o modelo heliocêntrico de Copérnico, para além de deitar por terra a exclusividade de só haver lua para a Terra!
Foram precisos muitos e melhores telescópios, e cerca de 400 anos, para, em 1995, os astrónomos Michel Mayor e Didier Queloz, do Observatório de Genebra, na Suiça, detectarem o primeiro planeta noutro sistema solar que não o nosso. O planeta extra-solar, ou exoplaneta, orbitava a estrela Pégaso-51 a 50 anos-luz de distância da Terra. Descobria-se o que alguns ousados tinham previsto: os planetas que rodeiam o nosso Sol não são os únicos no Universo!
Depois de duas décadas, já foram detectados mais de 3500 exoplanetas e os astrónomos e astrofísicos estão convencidos de que pelo menos a maior parte das estrelas serão orbitadas por planetas.
No início de 2015, um artigo de uma equipa internacional com vários cientistas portugueses, cujo primeiro autor é o português Tiago Campante, da Universidade de Birmingham, no Reino Unido, divulgava a descoberta de cinco planetas rochosos, com tamanhos entre Mercúrio e Vénus, no sistema solar Kepler-444. Intensificava-se a procura de planetas semelhantes à nossa Terra, que orbitem a sua estrela na zona dita habitável, em que a existência de água no estado líquido é teoricamente possível.
Em Maio de 2016, uma equipa internacional liderada por Michaël Gillon, e da qual fazia parte Didier Queloz, publicou, num artigo na revista Nature, que à volta da estrela Trappist-1, uma anã vermelha com apenas 8% da massa do Sol e situada a 39 anos-luz da Terra, tinham sido descobertos três planetas do tamanho do nosso planeta azul. Esta descoberta mobilizou astrónomos de todo o mundo e muitos telescópios – desde o telescópio espacial Spitzer, da NASA, até telescópios situados no Chile, em Marrocos, no Havai, em Liverpool, nas Canárias e na África do Sul – que passaram a escrutinar como nunca antes a estrela Trappist-1.
E o resultado deste esforço observacional astronómico foi agora publicado, novamente na revista Nature (http://www.nature.com/nature/journal/v542/n7642/full/nature21360.html), e é uma descoberta extraordinária: Trappist-1 tem pelo menos sete planetas de tamanho semelhante ao da Terra e três deles situam-se na zona habitável. Os seus nomes são Trappist-1b, c, d, e, f, g, h, por ordem crescente de distância à estrela.
“Descobrimos que cinco dos planetas (b, c, e, f, g) têm tamanhos semelhantes à Terra, enquanto os outros dois (d, h) têm um tamanho intermédio entre Marte e a Terra. A massa estimada para os seis planetas mais interiores sugere a existência de composições rochosas”, pode ler-se no artigo cujo autor principal é de novo Michaël Gillon e de cuja equipa faz parte a portuguesa Catarina Fernandes, que está a fazer o doutoramento em astrofísica na Universidade de Liège, na Bélgica.
Esta descoberta já está a mobilizar mais meios telescópicos. O telescópio espacial Hubble já está a estudar a composição das eventuais atmosferas dos planetas do sistema solar Trappist-1. E muita expectativa se existe sobre o que é que se poderá descobrir com a próxima geração de telescópios, como o telescópio espacial James Webb (da NASA) e o Telescópio Europeu Extremamente Grande (do ESO). Estes irão procurar moléculas compatíveis teoricamente com a existência de uma actividade biológica.
As questões sobre a existência de vida extraterrena elevam-se, assim, para além do sonho que a ciência fertiliza.
António Piedade
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