Os senhores do mundo por Noam Chomsky
Linguista, cientista cognitivo de renome mundial, Noam Chomsky, um quase octogenário, é indiscutivelmente o ativista político norte-americano mais considerado pela independência e rigor das suas análises. É temido por tudo quanto escreve ou profere em conferências acerca de assuntos tão díspares como as ingerências militares norte-americanas, o imperialismo israelita e a mentira dos intelectuais ao serviço dos exploradores do mercado, com as suas patranhas liberais. “Os senhores do mundo”, por Noam Chomsky, Ensaios e conferências entre 1969 e 2013, Bertrand Editora, 2016, é uma obra de indiscutível importância para conhecer o vigor e o espectro de interesses de Noam Chomsky, como escreve no prefácio Marcus Raskin, “Chomsky está bem ciente das limitações dos líderes e seus assessores, da arrogância, grandiloquência e intenções malignas que se escondem nas suas palavras. Não importa se esses líderes são eleitos ou nomeados, se chegaram ao cargo através de relações sanguíneas, vantagem económica, ou mesmo como resultado de algum nível de instrução considerado útil à elite dominante. Está consciente de que os oligarcas não governam em serviço do interesse público, mas sim do seu próprio interesse”.
Impressiona a coerência deste pensamento, a capacidade de denúncia dos crimes sem olhar a quem. A administração norte-americana, republicana ou democrata, pauta-se sempre pelos mesmos princípios, independentemente do fim histórico da Guerra Fria: a América tem pleno direito de intervir onde os seus interesses podem estar a ser afetados, destruindo a economia da Nicarágua, apoiando ditadores com tropas e elementos da CIA, fechando permanentemente os olhos ao expansionismo israelita, recusando-se a acatar exigências do Tribunal Internacional de Justiça. Por vezes, o cientista e ativista Noam Chomsky choca os seus auditórios quando revela que os pais fundadores dos EUA eram eminentemente críticos às linhas imperiais que a Casa Branca prossegue, de acordo com as oligarquias que estão na sua órbita. Lembra Tocqueville, Jefferson e Adam Smith, que encaravam a igualdade de condições com uma caraterística importante de uma cidade livre e justa. Ou o filósofo John Dewey, que defendia que não podemos falar seriamente sobre democracia num regime de poder privado. É impressionante o número de exemplos de ingerências, vendas de armas a países que prosseguem a guerra e onde muitas vezes os EUA vão intervir. Os governos norte-americanos socializam os prejuízos ou chegam a proceder a nacionalizações para salvar empórios. Lembra a Lockheed que foi salva do colapso por garantias federais de 2 mil milhões de dólares fornecidos pela administração de Nixon, e os exemplos multiplicam-se nos tempos de Bush pai e filho e mesmo de Bill Clinton.
Estes senhores do mundo arrogam-se a princípios messiânicos e recorda George Bush a proclamar que “Deus mandou-nos atacar a Al-Qaeda e eu ataquei-os, depois disse-me para atacar Saddam e foi o que fiz” e, “agora estou determinado a resolver os problemas do Médio Oriente. Convém não esquecer que um homem hoje santo por decisão de Roma, o arcebispo Romero de El Salvador, assassinado em 1980, bem como o conjunto de intelectuais jesuítas foram assassinados e treinados pelos responsáveis em Washington e pelos seus mentores. Dias antes de ser morto, Romero implorou ao presidente Carter para não prestar assistência militar à Junta Militar, o que “seguramente aumentará a injustiça aqui e aguçará a repressão que tem sido lançada contra as organizações do povo que lutam para defender os seus direitos humanos mais fundamentais”.
O terrorismo é tratado com a maior funcionalidade pelas políticas de defesa e de relações interiores e exteriores, a doutrina flutua segundo a tabela das marés dos grandes interesses: na Líbia, em Israel, na África do Sul, na Síria, no Egipto. Os países podem na estar na lista de países terroristas à mercê de contingências e manigâncias diplomática. Diz Chomsky que Clinton se ofereceu para retirar a Síria dessa lista se esta concordasse com os termos de paz apresentados pelos EUA e Israel. Quando a Síria insistiu na recuperação do território que Israel conquistou em 1957, permaneceu na lista de Estados que patrocina o terrorismo, apesar do reconhecimento de Washington de que a Síria não é implicada no patrocínio de terrorismo…
E é muito bom ler o que ele escreve sobre o cinismo político à volta das mudanças climáticas e como se paga a certos cientistas para que procurem convencer o público que os perigos ambientais não são tão grandes como a comunidade científica propala… É a técnica de enganar o pagode, os senhores do mundo não querem desocupar o lugar.
De leitura obrigatória.