Os Elementos de Terras-raras – um recurso natural de Monchique
A procura mundial de elementos de terras-raras está em crescimento. A produção destes elementos, principalmente na China, não consegue responder à procura. Na Europa não há atualmente produção destes elementos e este facto implica um risco acrescido para a indústria de eletrónica e para a produção de energia verde. O complexo ígneo intrusivo do eixo Fóia e Picota, em Monchique, apresenta fatores parecidos com os locais do sul da China onde há minas destes elementos. Porém, a investigação ainda está longe de indicar depósitos viáveis.
No dia 16 de julho de 2015, a associação ambiental A Nossa Terra organizou uma palestra sobre a presença de elementos de terras-raras em Monchique. A organização do evento contou com o apoio da empresa DFG, operadora da pedreira da Nave e da Câmara Municipal. O investigador especializado em geoquímica ambiental, da Universidade de Brighton, o Dr. Liam Hardy, descreveu os resultados preliminares da investigação em curso.
O que são terras-raras?
Os elementos de terras-raras ou metais de terras-raras formam um conjunto de 17 elementos químicos que inclui o escândio (símbolo químico Sc), o ítrio (Y) e os 15 elementos da série dos lantanídeos [do lantânio (La) ao lutécio (Lu)]. O cério (Ce) é o mais abundante dos elementos de TR e o 25º elemento mais abundante na crosta terrestre. Pela sua instabilidade isotópica, o promécio (Pm) é o mais raro dos elementos de TR.
As terras-raras estão amplamente distribuídas na crosta terrestre, mas em baixas concentrações. As maiores reservas encontram-se na China, na Comunidade dos Estados Independentes (CEI), nos Estados Unidos da América (EUA), na Índia e na Austrália. A aplicação desses elementos está voltada para a produção de catalisadores, imãs permanentes, ligas metálicas, polidores, fosforescentes, corantes e cerâmicas – componentes importantes para a fabricação de equipamento eletrónico incluindo televisões, telemóveis, tabletes, aerogeradores e ainda viaturas elétricas. Além dos escassos recursos minerais que lhe servem de matéria-prima, a sintetização de cada elemento requer alta tecnologia, o que onera substancialmente a cadeia de produção.
Os depósitos de terras-raras
Neste momento, a China supre 97% da produção mundial destes elementos. A China possui vários tipos de depósitos, sendo que no sul desse país os elementos de terras-raras surgem retidos na forma iónica em argilas lateríticas (mistura de óxidos e silicatos). A extração de elementos de terras-raras a partir destes depósitos de argilas lateríticas ocorre nas províncias de Guangdong, de Hunan, de Jiangxi e de Jiangsu. Nestes depósitos, o teor de óxido de ítrio pode chegar a 65%.
A argila laterítica é um material argiloso avermelhado que é duro quando seco, bem conhecido pela aplicação na construção de estradas em países tropicais. Este material argiloso é rico em óxidos de ferro e alumínio e é formado pela degradação das rochas ígneas em climas quentes e húmidos. A erosão pela chuva intensa liberta os elementos de terras-raras presentes nas rochas ígneas alcalinas (tal como no sienito em Monchique), que depois são concentrados por absorção dos minerais nas argilas lateríticas.
Estudos anteriores, efetuados entre 1980 e 2010, identificaram que em Monchique a rocha contém um teor interessante de elementos de terras-raras, tal como nas formações semelhantes no Banco de Gorringe (250km sudoeste de Sagres), em Sines e em Sintra. Recentemente, foram também localizados depósitos de argila laterítica, desconhecendo-se, todavia, a sua extensão bem como o conteúdo de elementos de terras-raras.
Porque procurar depósitos de terras-raras na Europa?
Na China, a exploração das minas de elementos de terras-raras resultava em prejuízos socioambientais graves: 191 milhões de toneladas de resíduos despejados sem tratamento; 130 km2 de florestas destruídas em minas a céu aberto; mais de 32 mil mortos desde 2006 em deslizamentos de terra e um declínio significativo na biodiversidade aquática resultante da contaminação da água. Por estas razões socioambientais e também por questões económicas, desde 2005 que o governo chinês limita a exportação destes elementos.
A União Europeia avaliou os riscos associados à quebra de fornecimento dos materiais primários e a sua importância económica. Esta avaliação identificou os elementos de terras-raras como materiais primários críticos para determinadas tecnologias e para os quais não há substitutos viáveis. Foram estabelecidos os projetos EURARE e SoS Rare para investigar os recursos europeus e os métodos aceitáveis para a sua produção.
Quais as alternativas à mineração a céu aberto?
Para alguns produtos há substitutos para os elementos de terras-raras. Para outros ainda não há. Um estudo pioneiro na Alemanha conseguiu construir turbinas livres de neodímio, mas eram muito caras e somente turbinas maiores que o normal tinham uma eficiência aceitável. Ainda não há alternativas práticas para telas coloridas nem para componentes de motores híbridos.
Atualmente, a reciclagem dos elementos de terras-raras é quase nula e deve ser ampliada. Os produtos que contêm estes elementos são ainda novos, e a tecnologia de reciclagem está ainda pouca desenvolvida. Ao mesmo tempo, uma taxa de reciclagem de 100% na Europa não satisfará a procura destes elementos nos países em desenvolvimento, onde o mercado está entrando numa fase de expansão.
As lamas vermelhas que resultam da extração de alumínio muitas vezes contêm teores de terras-raras economicamente interessantes. O projeto EURARE inclui uma investigação dos métodos de processamento destes resíduos, que podem fornecer cerca de 10% da procura na Europa. Hungria, Alemanha e Grécia são países que têm antigas minas de bauxite que ainda contêm lagoas com estas lamas.
Na Europa há outros depósitos de minerais com teor economicamente interessante de elementos de terras-raras. Por exemplo, na Turquia há depósitos de areias onde os minerais mais pesados foram depositados durante o transporte. Porém, muitos destes depósitos também contêm produtos radioativos que dificultam a extração do minério. A mina de Kvanefjeld, na Groenlândia, está iniciando produção experimental. Os projetos europeus, EURARE e SoS Rare, incluem investigação das alternativas para extração de elementos de terras-raras sem necessitar da abertura das minas a céu aberto. Uma das alternativas prevê a instalação de furos para injetar uma solução de sais, a fim de dissolver os elementos pretendidos e a extração da matéria concentrada através de outros furos, sem movimentação das terras ou destruição da floresta.
Qual o potencial em Monchique?
À primeira vista, Monchique tem uma série de fatores indicativos de potencial para se encontrar reservas económicas de elementos de terras-raras em argilas lateríticas.
O seu clima apresenta um ciclo de estações chuvosas e secas e a temperatura do ar é relativamente elevada. A sua geologia inclui grandes intrusões ígneas alcalinas, que foram expostas há milhares de anos, permitindo processos de erosão e concentração de elementos de terras-raras. Tal como no sul da China, estas condições são propícias para a plantação de florestas de eucalipto. Ademais, o concelho tem um historial de extração mineral, está próximo das minas do sul do Alentejo onde há mão-de-obra especializada, e não está distante de boas infraestruturas de transporte para as zonas industriais.
Porém, há muitos fatores contraindicativos. Neste momento, não há dados indicativos da existência de uma reserva de tamanho adequado. Até alguns dos dados iniciais indicam somente teores baixos e pouco económicos. Também é uma região com outras atividades económicas incompatíveis com a mineração em escala maior, a população é dispersa e não há zonas completamente desabitadas, e a paisagem natural contém muitos recursos naturais com um alto nível de biodiversidade. A abertura de uma mina nesta zona será morosa.
Numa área com condições ideais, o processo de abertura duma mina normalmente leva mais de dez anos. Apesar do potencial observado em Monchique, as condições para a extração de elementos de terras-raras ainda não são as ideais.