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O Inferno não faltou ou a crónica do incêndio anunciado

Concretizou-se o que muita gente, em Monchique, previa, ou temia, que acontecesse. A tradição, reunidas que estavam as condições, cumpriu-se. Depois dos grandes incêndios no centro e norte do país, é costume que em setembro caiba a vez à serra algarvia. Estava também na altura, o período habitual de descanso estava a fechar-se. A dúzia de anos que decorreu desde os grandes incêndios de 2003 e 2004 é idêntica à que a precedeu, desde o fogo de 1991.

São coincidências que deverão ser levadas em conta em qualquer investigação séria. Tal como as técnicas usadas pelos incendiários, demais repetidas em diversas zonas do território, nomeadamente na disseminação dos focos de incêndio que levam à inevitável dispersão dos meios de combate, que terá como consequência o aumento da área ardida e do tempo necessário para a resolução.

Este tipo de ocorrências nada tem a ver com ignições provocadas por descuido (embora infringindo a lei que não permite foguear nesta época do ano) ou mesmo dolosamente, como ato de vingança ou na sequência de qualquer distúrbio mental.

Apesar de perpetrados por indivíduos diferentes e em locais muito distantes, parecem obedecer às mesmas normas de execução. Com tantos detidos, suspeitos por fogo posto, não haverá interceção de dados nos diversos interrogatórios que indique um responsável comum? Não se poderá deixar de aprofundar a investigação com a preocupação da defesa dos direitos dos arguidos, esquecendo os dos ofendidos. E neste caso dos incêndios, os ofendidos não são só aqueles os que mais diretamente sofrem com eles, na vida, na saúde e na propriedade, como também a própria economia nacional com efeitos gravosos na generalidade dos cidadãos.

No caso concreto do recente incêndio em Monchique, em que é detido em flagrante um homem de Alte, há que perceber por que veio espalhar fogo por esta serra, gastando dinheiro (seu?) na deslocação, quando tinha a Serra do Caldeirão a dois passos. Ação perfeitamente planeada, levada a efeito em dia que os meteorologistas indicavam de elevado risco de incêndio para aquele concelho. Melhor dito, dia de boa propagação de incêndio, que o risco será diminuto se for cumprida a proibição de foguear.

Claro que há outros fatores que facilitaram a propagação e dificultaram o combate, como a elevada quantidade de matéria combustível na mata por falta da limpeza adequada, o ordenamento florestal que tarda a implementar, a carência de uma política de ocupação equilibrada do território nacional, o calor, a baixa humidade do ar e a dificuldade nos acessos. Contudo, se o fogo não tivesse sido posto é muito provável que o incêndio não tivesse tido lugar.

Existem várias comissões e grupos de estudos, espalhados por diversos organismos, a analisar o fenómeno dos incêndios florestal, aos mais diversos níveis, mas parece haver falta de eficácia no combate ao banditismo dos fogos postos, de conhecimento como está organizado e de quem o fomenta e sustenta. É imenso o papel que cabe ao Estado neste domínio…

Há, porém, uma coisa que não faltou e que não é de mais aqui enaltecer: o sacrifício e a abnegação dos bombeiros.

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