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Hospício e Eremitério de Nossa Senhora do Carmo, na Picota

Antigos Conventos de Monchique

Ao longo da sua História a área actual do concelho viu nascer pelo menos quatro comunidades monásticas masculinas e uma feminina: o Convento de Nossa Senhora do Desterro de Monchique, edificado por Pedro da Silva “O Mole”, futuro vice-rei da Índia; o Hospício e Eremitério de Nossa Senhora do Carmo, na Picota; o Hospício dos Religiosos da Piedade, nos Casais, que já tinha desaparecido em 1758; o Eremitério de Nossa Senhora do Carmo, nos Pegos Verdes, antiga freguesia de Nossa Senhora do Verde do concelho de Monchique, fundado após o Terramoto de 1755 pelos eremitas idos da Picota; e o convento de freiras que aqui funcionou nos séculos XVII-XVIII.

Em 1816 havia no Algarve 15 conventos de frades e 3 hospícios, estando dois deles situados no concelho de Monchique. Com o triunfo constitucional, os conventos que restavam foram abrangidos pelo decreto de 30 de Maio de 1834, de Joaquim António de Aguiar, o «mata frades», que acabou com alguns séculos de vida conventual, que também proporcionava auto-subsistência e assistência espiritual e curativa e instrução.

Hospício e Eremitério de Nossa Senhora do Carmo, na Picota

Estava situado na encosta sul da Picota, em local bastante inóspito e agreste e foi mandada erguer no século XVI pelo bispo de Silves D. Fernando da Silva Coutinho e entregue aos frades Agostinhos, que aqui estiveram até à segunda metade do século XVIII.

A Ordem dos Clérigos Regulares de Santo Antão tinha seguido, a partir de 1297, a Regra de Santo Agostinho. Dedicavam-se a curar doentes, inclusivamente leprosos e usavam hábito preto com uma cruz branca em forma de tau, que simbolizava a maleita dos doentes.

A primeira notícia que temos deste Mosteiro é de 20 de Abril de 1651 quando foi baptizada na paróquia uma criança de nome Lúcia, filha de Maria, escrava de Pedro Andrez “o Velho”, cujos padrinhos foram o «freire» Mateus Fernandes e Leonor de Jesus Francisca, esta «escrava do Ermitério do Carmo».

A 13 de Outubro de 1686 foi sepultado como pobre, na igreja da Misericórdia, João Baptista, «ermitão da Picota», natural de Portimão.

Outro «ermitão da Picota» aqui falecido foi Domingos de Santo António, daqui natural, que foi igualmente enterrado como pobre na igreja da Misericórdia, a 2 de Fevereiro de 1687.

Manuel de Jesus Maria, «monge de Nossa Senhora do Monte do Carmo, sítio da Picota» faleceu a 16 de Novembro de 1733 e foi enterrado em sepultura gratuita na igreja paroquial.

Por volta de 1750 os enterramentos de irmãos já se faziam na igreja do mosteiro, pois o «irmão» Sebastião de Jesus falecido a 8 de Janeiro desse ano no «Hospício da Picota» foi sepultado na igreja deste cenóbio deixando por testamenteiro Estêvão Rodrigues deste lugar.

Manuel Figueiras, «monge da Picota» casado e natural da Mexilhoeira Grande, morreu a 20 de Janeiro de 1756, não fez testamento, recebeu os sacramentos e foi sepultado «na mesma igreja de Nossa Senhora do Carmo».

Vê-se por este termo, que pelo menos a igreja não terá caído com o Terramoto do 1.º de Novembro de 1755, e o mesmo se deduz pelo texto da Memória Paroquial de 1758, da Freguesia de São Romão de Alferce, onde o cura informa que a esta ermida «costuma ir gente de romagem alguns dias do ano», supondo-se que nesta altura fosse uma espécie de santuário de peregrinos.

Outra informação vem na Memória Paroquial da freguesia de Monchique, também de 1758, onde o prior António de Figueiredo Aração escreve que «a Eremita de Nossa Senhora do Carmo é da jurisdição do Senhor Bispo deste Reino, não tem administrador particular e foi erecta com esmolas deste povo», não pertencendo, neste caso, ao senhorio da rainha.

Todavia, João Baptista da Silva Lopes afirma que pelo Terramoto lhe caiu «todo o hospício e igreja», o que poderá ter acontecido posteriormente devido às potentes réplicas que se lhe seguiram, nomeadamente as de 14 de Dezembro de 1755, de 1 de Janeiro de 1756, de Junho de 1756, e de 14 de Agosto de 1756.

O enterramento seguinte foi o de Bartolomeu Martins Cavaco, que talvez fosse religioso, falecido na «ermida da Picota» a 13 de Janeiro de 1759, que no entanto foi sepultado na «paroquial de Monchique».

Seria depois desta data (1759) que os monges se terão retirado para o sítio dos Pegos Verdes, na então freguesia da Senhora do Verde, onde edificaram outro mosteiro, que ainda existe na actualidade a servir de habitação.

Na Picota havia ainda, no ano de 1758, a chamada “Fonte dos Eremitas”, uma nascente caudalosa de onde procedia a Ribeira do Monchicão.

Na Inquisição de Évora existe o processo (incompleto) do padre José Monteiro, monge da Serra da Picota (Monchique), que foi acusado de «bruxaria e delato», por José Francisco Veludo, do Colégio da Companhia de Jesus de Faro.

Em Março de 1802 aparece nos arquivos paroquiais um frei António, religioso do Carmo, o que nos leva a pensar que o edifício ainda seria habitado nesta data por algum ermitão que aqui terá permanecido.

Também nos anos de 1806-1808 era coadjutor interino da paróquia, o padre frei Marcos de São José, carmelita descalço, que deveria ter também ligação com este mosteiro, visto estes serem um ramo da Ordem do Carmo.
Em Janeiro de 1810 aparece como padrinho de uma criança aqui baptizada o carmelita descalço frei António da Piedade, que no entanto morava no convento de Tavira.

Durante o período da guerrilha miguelista, as ruínas serviram de aquartelamento das tropas do Remexido. João Baptista da Silva Lopes, em 1841, diz que «ainda lá se vêem as escadinhas dos monges» e uma «fonte chamada dos monges», vestígios que ainda se podiam detectar antes do abandona da serra e da invasão dos eucaliptos.

A imagem de Nossa Senhora do Carmo, com o menino, posada em três anjos, encontra-se hoje na igreja matriz de Monchique, na capela de N.ª S.ª do Carmo sendo, segundo Francisco Lameira, do século XVIII e que terá aqui ficado depois da migração do ermitério.

Da segunda fase do cenóbio terão restado duas imagens de Nossa Senhora do Carmo, que hoje se encontram na igreja matriz de Portimão e na igreja do Colégio desta cidade.r
Notas e bibliografia
COSTA, Pe António Carvalho, Corografia portugueza e descripçam topografica do famoso reyno de Portugal (…), 1706.
Duas Descrições do Algarve do Século XVI, apresentação, leitura, notas e glossário de Manuel Viegas Guerreiro e Joaquim Romero Magalhães, Cadernos da “Revista de História Económica e Social”, Sá da Costa, 1983.
LAMEIRA, Francisco, Inventário artístico do Algarve: a talha e a imaginária XVI. Concelho de Monchique, DRMC, Faro, 1997.
LOPES, João Baptista da Silva, Corografia do Reino do Algarve (…), Lisboa, 1841.
SAMPAIO, José Rosa, Convento de Nossa Senhora do Desterro de Monchique: Um Passado à espera de Futuro, 2014;
– Os Antigos Conventos de Monchique, 2.ªed., 2017.
– O Convento de Freiras de Monchique nos Séculos XVII-XVIII, 2018.
SANTA MARIA, Frei Agostinho de, Santuário Mariano (…), 1718, Tomo VI, Livro II, pp.428-430.
TT, Dicionário Geográfico, “Memória Paroquial de Monchique”, vol.23, pp.1141-1150.
TT, Inquisição de Évora, proc. 11701. A data de prisão e a sentença não se encontram no processo.
TT, Baptismos, 1618-1681, p.155.
TT, Baptismos, 1795-1803, p.172.
TT, Baptismos, 1803-1815, pp.102 e 147.
TT, Óbitos, 1681-1714, pp.37 e 38.
TT, Óbitos, 1714-1739, p.121.
TT, Óbitos, 1739-1787, pp.57, 96 e 111.

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