“Temos de estar sempre a reinventar-nos”

A Associação Vicentina comemorou recentemente o seu 30.º aniversário. Aura Fraga, presidente desde 2015 falou ao Jornal de Monchique num “balanço muito positivo” das ações que a Associação fez em Monchique e nos outros seis concelhos do Barlavento Algarvio, mas admite que “é preciso olhar para a associação e para a maneira como está estruturada” num processo que implica analisar “o território, fazer um diagnóstico deste território e, no âmbito de uma parceria alargada e mais robusta, tentar reestruturar, elaborar uma nova estratégia para mais um período alargado de trabalho”.

Jornal de Monchique – Quais as áreas da atuação da Vicentina?

Aura Fraga – A Vicentina é uma associação de desenvolvimento local que usa uma metodologia e procura ter uma estratégia de desenvolvimento integrado. Olhando para todas as áreas do território, nós chegámos a uma altura em que sentimos necessidade de estruturar a nossa atividade, criando grandes eixos de intervenção. Um dos eixos é a dinamização económica, onde se inserem os DLBC’s, os apoios ao investimento no âmbito do PDR e do GAL ADERE 2020, outro eixo de intervenção é a formação e o emprego, que são aspetos essenciais para o desenvolvimento de um território. Temos ainda o património natural e cultural, que é outro grande eixo de intervenção. Temos projetos na área do património cultural e natural; na área da inovação e do desenvolvimento social também existem alguns projetos de intervenção na área social e para públicos muito específicos, como idosos, famílias e crianças; na área do emprego para situações mais complexas, como o desemprego de longa duração, pessoas de baixas qualificações, e, mais recentemente, achamos interessante classificar a nossa atividade em mais uma área, que é de cooperação. Temos vários projetos com parceiros a nível regional, nacional e até transnacional, havendo uma área de cooperação com outras entidades, outras estruturas, mais ou menos congéneres, e com quem desenvolvemos projetos em conjunto com entidades e instituições regionais.

JM – Qual a área de atuação da Vicentina?

AF – Nós trabalhamos, essencialmente, aqui na área do Barlavento em sete concelhos, nomeadamente, Lagos, Vila do Bispo, Aljezur, Monchique, Portimão, Lagoa e Silves.

JM – A Associação Vicentina celebrou recentemente os seus 30 anos de atividade. Que balanço é que faz destas três décadas nas várias áreas de atuação?

AF – O balanço foi um desenvolvimento grande da nossa intervenção, desde o início. Começou com o programa Líder, que era uma iniciativa comunitária que tentou promover a criação de parcerias alargadas em territórios muito específicos e atuando de acordo com determinada metodologia: um território, uma parceria e uma estratégia. Rapidamente, com o financiamento que obteve para apoiar a estratégia no âmbito dessa iniciativa comunitária, a Vicentina começou a atuar noutras áreas complementares que se achava que eram muito importantes para a estratégia que tinha, como foi a formação profissional. Começámos a trabalhar na área da formação profissional, do emprego e depois, mais tarde, fomos também procurando ter projetos em outras áreas, porque nós percebemos que uma estratégia integrada de desenvolvimento implica trabalhar em áreas diversificadas que têm depois impactos umas nas outras. A formação tem impacto no emprego, na dinamização económica. O património é um recurso muito importante do território para ser aproveitado, valorizado, portanto começámos a trabalhar na área do património cultural e natural. As questões sociais também vieram logo ao de cima, pois quando se começa trabalhar num território específico e ao olhar para esse território de uma forma integrada e global, essas áreas surgem todas e nós fomos complementando a nossa intervenção com outros projetos e outras intervenções nessas áreas.

JM – Portanto, o balanço é…

AF – O balanço é muito positivo. Permitiu que a Vicentina se estruturasse, que criasse uma equipa técnica multidisciplinar, com competências também diversificadas nessas diversas áreas, da dimensão económica, formação e emprego, património. Portanto, 30 anos depois, temos uma equipa técnica qualificada para trabalhar nessas áreas e temos aqui um trabalho forte que é de fazer uma reavaliação, porque 30 anos é muito tempo e as coisas mudam. O território mudou, tem necessidades e após três décadas, é preciso olhar para a associação e para a maneira como está estruturada, como está ligada ao território, à região e às necessidades do agora. O processo que estamos a tentar desencadear é voltar a olhar para o território, a fazer um diagnóstico deste território e, no âmbito de uma parceria alargada e mais robusta, tentar reestruturar, elaborar uma nova estratégia para mais um período alargado de trabalho.

JM – Falando agora do ponto de vista local, qual é o balanço destes 30 anos em Monchique?

AF – No concelho de Monchique, o balanço que nós fazemos dos 30 anos é bastante positivo. É o concelho onde a Vicentina se estabeleceu e estruturou atividade de uma forma muito consistente, digamos assim, porque desde logo houve iniciativas e projetos especificamente dirigidos aqui para o concelho, nomeadamente no âmbito dos contratos locais de desenvolvimento social (CLDS’s) e em que a Vicentina executou vários projetos e foi estruturando atividade e respostas, especialmente uma resposta social que foi incorporada pelo município, de alguma maneira. Quando esses projetos terminaram sentiu-se a necessidade de dar continuidade ao trabalho, estou a falar do Centro de Apoio à Família e à Comunidade (CAFC), que atualmente desenvolve uma intervenção clínica em parceria com o Agrupamento de Escolas de Monchique (AEM) e com o Município e que dá aqui um apoio extra às crianças com maiores dificuldades ao nível das aprendizagens, da escola, emocionais e criou-se uma equipa que ficou a trabalhar, o que foi muito interessante. Além disso, o Gabinete de Inserção Profissional que também nós gerimos há muito tempo aqui no concelho e que continuamos a gerir. É um apoio muito relevante, porque as pessoas, em vez de se deslocarem ao Centro de Emprego em Portimão, conseguem, através de nós, manter uma ligação próxima e resolver alguns problemas, evitando deslocações a Portimão. Ao nível dos apoios dos investimentos de pequenos produtores, é um concelho que responde bem às nossas propostas. Temos muitos projetos no concelho e conseguimos estabelecer uma grande ligação às associações, às juntas de freguesia, ao município para trabalharmos de uma forma concertada. Portanto, é um município onde temos um polo aberto com uma equipa técnica a trabalhar, inclusivamente agora estamos a gerir mais um CLDS’s. Pelo histórico que nós tínhamos, o município voltou a convidar a Vicentina para executar e é um concelho onde já temos muita coisa feita.

JM – Como o projeto SerrAdentro…

AF – Como o projeto SerrAdentro, exatamente.

JM – Há quantos anos é que exerce o cargo de presidente da associação?

AF – Eu já fazia parte da direção há alguns anos, mas assumi a função de presidente da associação a partir de 2015.

JM – Que momento ou que momentos a marcaram mais durante o seu mandato como presidente desta associação?

AF – O que me marcou mais foi a capacidade de manter a organização, apesar das dificuldades, porque uma associação do tipo da Vicentina funciona muito em articulação com parceiros, com oportunidades de financiamento através de fundos comunitários. Temos de estar, de certa forma, sempre a reinventar-nos e a fazer adaptações ao trabalho que nós fazemos, a procurar novas oportunidades de financiamento para necessidades que nós detetamos ou que nós sentimos que podem ser relevantes para o território. É um processo de adaptação responder diariamente ao território, às necessidades, às pessoas, às oportunidades e tentar trazer essas oportunidades para o nosso território e isso é, de facto, um trabalho que é exigente. Manter uma equipa nessas circunstâncias não é muito fácil. É preciso uma gestão muito continuada e temos conseguido, inclusivamente, dinamizar projetos que para nós foram de referência para o território. Falo na Bienal de Turismo Natureza, dos CLDS que fizemos aqui em Monchique e montar o Centro de Apoio à Família. Mais atualmente, estamos a trabalhar na rede regional de mercados locais. Agora, estamos outra vez num período muito marcante que é a reorganização, a parceria e o trabalho para um novo momento de intervenção. É marcante quando conseguimos, por um lado, manter a entidade a funcionar e a intervir, por outro, no desenvolvimento de alguns projetos que vão tendo impactos importantes para o território.

JM – Olhando para o que o Barlavento Algarvio era há 30 anos, quais é que considera que foram as principais mudanças para a região do ponto de vista socioeconómico?

AF – Quando nós começámos a nossa atividade aqui e quando eu cheguei, que foram poucos anos depois, já havia o domínio do setor do turismo, que é uma coisa que se mantém. Agora, é um turismo que evoluiu. Tínhamos um turismo de sol e praia, essencialmente, muito focado nos meses de verão, algo que ainda se mantém. Ainda existe muito a sazonalidade na atividade turística, que tem vindo a diversificar-se e a criar novos produtos e outra oferta que na altura não existia, ligada ao turismo natureza, ao património ambiental, às marcações dos percursos pedestres, aos festivais de observação de aves, portanto foram surgindo iniciativas que foram modificando a oferta turística e afirmando outros produtos que são muito úteis para esbater a sazonalidade. Se o turismo de sol e praia é muito feito no verão, o turismo mais cultural e de natureza idealmente será na primavera e no outono, e até mesmo o turismo rural. Esta diversificação de oferta tem sido importante para valorizar outros aspetos. Temos o surf também, as atividades de turismo ativo, portanto começaram a aparecer novos conceitos que permitiram a diversificação e essa será a grande diferença. Outra diferença muito grande é que a Autoridade Económica também se organizou melhor. Lembro-me que quando chegámos aqui a maior parte das destilarias de medronho ou das empresas de enchidos em Monchique funcionavam de uma forma muito menos estruturada, muitas delas nem estavam legalizadas. Houve todo um processo de melhoria da qualidade desses produtos, do seu registo e da sua certificação em alguns casos e, portanto, isso também mudou muito do ponto de vista socioeconómico.

JM – Aperfeiçoou-se o controlo dos produtos…

AF – Legalizaram-se, e atualmente existem muitas unidade aqui. Naturalmente aconteceu em todo o território. Acho que a atividade socioeconómica se tem vindo a organizar melhor, a legalizar e a funcionar de uma forma com maior qualidade.

JM – Há pouco falava do turismo ser muito à base de sol e praia, sente que quando começou a haver mais essa diversificação surgiu uma maior dinâmica nos concelhos de interior, como por exemplo em Monchique?

AF – Sim, embora Monchique seja um concelho que não depende tanto do turismo como outros concelhos. Se nós repararmos bem, Monchique tem atividade económica, para além do turismo e isto notava-se nas estatísticas de emprego. Quando diminuía a atividade turística por qualquer motivo, Monchique era o que se ressentia menos, porque tem uma diversidade de atividade económica, às vezes, até maior do que outros concelhos. Monchique tem as termas, que ocupam as pessoas durante mais tempo, tem os enchidos, tem o medronho, tem a pedreira, tem a floresta, portanto é um concelho que tem maior diversidade económica do que muitos concelhos do Algarve. Tem características muito próprias e que são interessantes.

JM – Na sua visão, qual é que acha que é a perceção das pessoas em relação à Associação Vicentina?

AF – Não é fácil responder a isso. Eu acho que a maior perceção que há em relação à Associação Vicentina é a nossa gestão do Adere 2020, portanto do apoio a projetos, porque nós, de facto, temos uma dotação financeira para investimento e aos quais as pessoas podem-se candidatar. As micro e pequenas empresas, podem fazer isso diretamente para receberem apoios ao investimento. E eu acho que essa é a principal perceção que as pessoas têm. Não foi sempre assim. Houve uma fase em que a Vicentina trabalhou muito na área da formação, inclusivamente aqui em Monchique, e noutros concelhos através dos Centros de Reconhecimento e Validação de Competências (RVCC) e nessa altura nós tínhamos um fluxo muito grande de pessoas que usufruíam da nossa oferta de formação e  educativa. Nos últimos, talvez, seis anos, o acesso a financiamentos na área da formação diminuiu muito, para entidades do tipo da Vicentina e perdemos essa ligação maior que nos permitia estabelecer com muitas pessoas dos concelhos em que atuávamos, e atualmente estamos mais associados aos apoios e projetos.

JM – Quais são os maiores desafios que a atual conjuntura tem colocado à Vicentina?

AF –  A covid foi terrível, porque embora tenhamos continuado a manter muita atividade, tivemos de fazer uma adaptação brutal à maneira como nós trabalhávamos, recorrendo muito ao digital, como toda a gente. O contacto direto com os promotores foi muito diminuído, foi substituído por reuniões por computador, e portanto foi um desafio grande e, inclusivamente, fez com que muitas atividades não pudessem ser realizadas, porque nós também fazemos muitos eventos e não foi possível. Foi preciso adaptá-los, embora alguns não se tenham conseguido fazer. Portanto, atrasou muita atividade que agora está para ser feita. Estamos com uma sobrecarga muito grande relativamente a projetos que temos que concluir a sua execução e que ficaram muito acumulados em cima uns dos outros. A inflação e a atual conjuntura económica criam-nos um desafio difícil, nomeadamente  nos apoios aos investimentos que nós fizemos… Nós aprovamos projetos com base num orçamento e em valores de apoio que atualmente estão muito desatualizados relativamente ao atual preço das matérias primas. E já estamos a sentir da parte dos promotores. As pessoas pensavam que iam ter um apoio de 40 ou 50% e agora, com os aumento de preços, percebem que o apoio que vão ter não reflete isso. É inferior, porque já não conseguem as coisas aos preços de quando fizeram o projeto e pediram orçamentos. Portanto, isso está a ter um impacto grande, inclusivamente há pessoas a retraírem-se um pouco ao nível do investimento, porque a incerteza é maior, a incerteza dos preços também e as pessoas retraem-se e defendem-se um bocadinho e ficam um bocado à espera. Naturalmente, está a ter impacto na execução dos projetos, no nosso compromisso financeiro e temos algumas desistências. E isso, de facto, está-nos a preocupar.

JM – Na sua opinião, quais são as soluções que o Barlavento Algarvio deve adotar face à atual crise hídrica que se vive?

AF – A crise hídrica tem impactos em todos os sectores de atividade económica, praticamente. Temos o golfe, as piscinas e os hotéis e temos a agricultura e já se sente. Também já tivemos projetos que não foram possíveis apoiar, porque as pessoas não conseguiram obter licença de utilização de recursos hídricos, uma vez que a exploração estava numa zona em que os lençóis freáticos já tinham pouca água. Soluções para isso, entre o uso muito racional da água, poupar o máximo possível. Além disso, a questão das alterações climáticas não é uma coisa apenas para o Sudoeste. Não vale a pena nós estarmos aqui com muitas medidas, se o resto do Algarve, o país e a Europa não fizer nada. A crise hídrica é muito complicada. Isto está a ser pensado a nível regional, inclusivamente a AMAL tem um projeto para se evitar as perdas de água, também se está a pensar numa solução de dessalinização para obter através da água do mar, a reutilização de água residuais para as regas do campo de golfe, portanto as entidades estão preocupadas com isso e a procurar encontrar soluções. É um problema grave, de facto, e que não tenho nenhuma solução milagrosa. A única coisa que nós esperamos é que quem tem a responsabilidade de gerir e de encontrar soluções, rapidamente as consiga para que possam esbater essas dificuldades. Sendo a agricultura responsável pelo grande uso da água, não antevejo como uma boa solução a redução da atividade  agrícola, porque se tem comer, porque quem trabalha na agricultura precisa de manter as suas culturas. Se calhar temos que fazer algumas adaptações, em vez de utilizarmos espécies muito exigentes em termos de recursos hídricos, produzirmos espécies menos exigentes desse ponto de vista. A adaptação das culturas a isso é importante ser feita, para termos culturas adaptadas ao clima.

JM – O que implica a próxima estratégia 2030? Que mudanças é que trará para a região e concretamente para Monchique?

AF – Nós vamos funcionando muito de acordo com os quadros comunitários e também com aquela transição de que a Vicentina já tem 30 anos, funcionou de uma determinada maneira, se calhar agora é preciso fazer uma nova reflexão, olhar novamente para o território, perceber as potencialidades e as fragilidades, reanalisar e, com base nisso, estruturar uma atividade para os próximos tempos, além de fazer escolhas através de uma estratégia que nos pareça mais adequada, naquilo que é a nossa intervenção. A Vicentina está a fazer um esforço grande para reestruturar, inclusivamente do ponto de vista associativo e de parcerias e está a procurar desenvolver uma estratégia que não dependa da atividade da Vicentina. Há tantas associações e organizações a trabalhar no território que, se calhar, faria sentido nós nos organizarmos numa forma mais articulada e dentro daquilo que é o objeto social e a vocação de cada um de nós. É uma aposta um bocadinho ambiciosa, mas acho que é possível. A Vicentina já trabalha há muito tempo no âmbito de parcerias, tem uma proximidade com muitas organizações e acho que é um desafio interessante, quer para a Vicentina, quer para as outras organizações. Termos aqui uma parceria estruturada, cooperante, colaborante e complementar dentro daquilo que são as atribuições de cada um nós.

JM – A Estratégia de 2030 tem alguma relação com o Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) ou são projetos diferentes com áreas de atuação também diferentes?

AF – Nós queremos tentar fazer um exercício de elaboração de uma estratégia que seja, de certa forma, independente daquilo que é o PRR. Naturalmente, não nos podemos abstrair disso e temos que ter a noção que são instrumentos que podem vir a ser necessários e utilizados, mas gostávamos era de ter um olhar sobre o território mais livre e tentarmos elaborar uma estratégia concertada e depois, em função dessa estratégia, irmos buscar os recursos que nós acharmos que são importantes para o desenvolvimento das ações e das intervenções que são necessárias para a implementação dessa estratégia. Portanto, fazer um exercício um bocadinho ao contrário, pelo menos agora nesta fase acho que é um momento importante. Não vamos pensar que recursos financeiros existem, que existe o PRR. Vamos esquecer isso, vamos olhar para o território e ver o que era interessante implementar e, dentro daquilo que nós acharmos que é interessante, então vamos ver quais são os recursos que nós temos financeiros e de políticas e de orientações que existem quer a nível regional, nacional e comunitário que possam, de certa forma, nos permitir implementar as medidas que nós achamos que são importantes na estratégia e as estratégias são propostas que requerem, depois, também, ajustes, adaptações e depois, até, complementar com outras propostas que nós percebemos que existem em termos de oportunidades de financiamento e que a gente possa complementar também essa estratégia.

JM – Fala-se muito da questão da regionalização. Acha que isso poderia trazer benefícios para o Algarve?

AF – Eu, sinceramente, vejo vantagens e desvantagens na regionalização. Acho que às vezes depende de como isso acontece. Normalmente, um processo de regionalização permite uma visão mais próxima, uma ligação maior entre as diversas entidades da região para resolver os problemas e, naturalmente, traz vantagens. Em vez de uma região estar sujeita a medidas de âmbito nacional, que às vezes até, não são muito adequadas para algumas especificidades regionais e até são mais adequadas para outras regiões, que acabam por beneficiar mais do que outras. Permite intervenções muito mais focadas naquilo que são as necessidades e os problemas daquela região. Agora não é um assunto sobre o qual eu me tenha debruçado muito a fundo, mas, se calhar, também se podia fazer no âmbito de uma descentralização acentuada. Podiam haver essas intervenções mais focadas no território e mais livres daquilo que seriam as intervenções de âmbito nacional. Acho que depende um pouco de como as coisas são implementadas. Eu tenho alguma dificuldade em antecipar como seria a regionalização, porque também leio e ouço comentadores de que o país não tem dimensão para uma intervenção regionalizada, visto que se tornam regiões muito pequenas. Há países que têm maiores dimensões em que a regionalização se torna uma necessidade absoluta. No nosso caso, não sei se uma descentralização bem feita não seria suficiente. Acho que é importante para se aprofundar o respeito pelas especificidades dos territórios e as necessidades dos territórios. Uma regionalização não sei se acrescentaria muito a essa descentralização forte.

JM – Há pouco falámos da estratégia 2030. O que representa o projeto “Articular para intervir”?

AF – Esse projeto foi uma iniciativa da CCDR Algarve que fez uma candidatura ao CRESC para o desenvolvimento de diversos estudos e intervenções e convidou as associações de desenvolvimento local do Algarve a serem parceiras: a Vicentina, a In Loco e a Terras do Baixo Guadiana. O projeto desenvolve-se em várias fases: avaliar, conhecer, diagnóstico e prospectar, que será a estratégia. E chama-se “Articular para intervir” porque era a articulação da CCDR com as três associações de desenvolvimento local do Algarve. Todas as associações estão a fazer o mesmo trabalho que a Vicentina está a fazer, que é avaliar o que foi feito, fazer um diagnóstico, conhecer o estado atual do seu território de influência e, depois, desenvolver uma estratégia com as especificidades. A CCDR teve a preparar um Programa Operacional Regional, portanto tem um diagnóstico. No fundo, o que nós fazemos depois será um diagnóstico com maior detalhe, focando-nos em cada concelho, em cada freguesia, em cada organização e, portanto, será mais local e específico. Naturalmente que haverá  intervenções que são relevantes, mas que serão noutros territórios do Algarve e seria interessante identificarmos essas intervenções que seriam transversais a serem desenvolvidas no Barlavento pela Vicentina, no Algarve Central pela In Loco e pelas Terras do Baixo Guadiana na zona do Sotavento e, portanto, chama-se “Articular para Intervir” exatamente por isso. Agora, cada um de nós também trabalha no âmbito da sua parceria e deverá articular-se com os seus parceiros locais, quer públicos, quer privados, associativos ou até mesmo empresariais, isto é, com atores locais, organizar-se para o desenho e implementação dessa estratégia que depois terá ligação às estratégias das outras organizações de desenvolvimento local.

JM – Que projetos pretende a Vicentina implementar no futuro?

AF – Eu não consigo dizer já. Nós estamos num processo de conhecer o território outra vez, de nos apercebemos da situação atual, de fazer um diagnóstico atualizado, com dados recentes. Houve os novos censos, houve o recenseamento agrícola também, e há dados novos que nós precisamos de conhecer. ,Vamos ter que fazer opções, portanto o mais importante para o território era trabalhar nesta ou naquela área. Relativamente aos projetos futuros, para além daqueles que temos em execução e que temos de concluir e que não decorrem desta estratégia, mas da atividade da Vicentina, naturalmente que vão surgir destes diagnósticos e também daquilo que são as orientações políticas atuais, porque há novos conceitos como os circuitos curtos, a economia circular, o greendeal. Há novos conceitos que traduzem orientações políticas em determinadas áreas, que, naturalmente, nós temos todo o interesse em incorporar naquilo que for a nossa estratégia. Quanto aos projetos futuros além do DLVC que são os apoios ao investimento, que nós ainda não conhecemos que tipo de apoio vamos poder dar, e também vamos ter de apresentar uma estratégia. Tudo vai depender um bocadinho dos parceiros, das opções que se fizerem e das oportunidades que tivermos. Portanto, vai-se ter que conjugar aqui várias coisas e é esse processo que está a ser desencadeado agora e, que com certeza, vai ter o momento alto no final de setembro com o fim do projeto “Articular para intervir”, que vai ter continuidade nas candidaturas que vamos que fazer ao DLBC e a outros, provavelmente, até ao final do ano.

Diogo Petreques

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